| Solange Palatnik |
Antônia | 50X50X50cm | Acrílica sobre tela
Solange Palatnik é Woman in Art© Alexandros Papadopoulos Evremidis
Convém, ab initio, ressaltar que o título da exposição, Women in Art, é um "duplo" achado... ben trovato - não por ser original, o que não pretende e nem é, mas por ser sempre bom fazer lembrar às mulheres que mulheres na arte são um fenômeno relativamente recente. Todo estudioso sabe que da Antiguidade até meados do século XX, o número de mulheres artistas se conta nos dedos das mãos (vá lá, em.... tour de force, acresça-se os dedos do pés).
Não que elas não quisessem ou, para tal, aptidão não tivessem, mas porque toda educação, e principalmente a artística, por maldita, lhes era interdita, como, aliás, tudo o mais, salvo os afazeres materno-domésticos e a precípua função de objeto de cama e mesa, a elas com ignóbil naturalidade atribuída pelo macho - tanto do não sapiente como do precariamente sapiente [está bem, em nova tour de force, salvaguardemos o sapiente (recente!)]. Foram necessárias algumas pequenas e grandes revoluções para subverter tal status quo e permitir às mulheres a conquista de um seu lugar ao sol, no rol de quase todas as humanas atividades. Não para agressivamente competir e, pior, guerrear a guerra dos sexos, mas para somar e contribuir com seus refinados engenho e arte.
E já chegamos à Solange Palatnik, de quem, na verdade, ainda que por vias oblíquas, estamos falando, ao longo deste longo pródromo: Altiva, ativa e combativa, há décadas, ela se empenha em combater o bom combate em favor dessa intérmina luta pela igualdade de direitos (única maneira de legitimar qualquer sociedade que se pretenda democrática), usando, ao invés de armas, ferramentas como a arte da palavra, já que também escritora e poeta de mestria, e a arte da pintura, qualificada e competente.
E, com isso, já estamos próximos de clarear o porquê do "duplo" achado inicial, pois que a temática de boa parte da produção pictórica de Palatnik se centra e concentra exatamente nas mulheres, que incessantemente retrata e, credenciada por seu posicionamento na vanguarda libertária, conclama a não esperarem acontecer mas sim fazer acontecer, assumindo e desenvolvendo seus atributos femininos, no que têm de particular, e humanos, em todo caso.
Posto o exposto, desnecessário dizer que tais retratos não são do tipo registros para confinar em álbuns de família ou corredores de residências. Com cores fortes e brilhantes, e significativamente rico impasto, as telas de Palatnik com sua materialidade e cromatismo exacerbados, no limite! são a mais candente expressão da alma feminina, de toda e qualquer extração social, revelando e reverberando a flamante intensidade de sua intimidade - seus anseios, aspirações, sonhos, desejos, perspectivas, atitudes. Como se em cada rosto, gesto e postura, o observador sensível divisasse de modo sutil mas inequívoco as nuances do desafio, do questionamento, do confronto e do enfrentamento, da dialética do por que sim? e do por que não?
Endurecer, mas também não esquecer de enternecer, razão porque também presentes se encontram as delicadezas do charme, do afeto, do sentimento, da sedução, do glamour da feminilidade. Tanto que, para complementar, Palatnik completa o cenário com encantadoras "feminices", como ela mesma diz, e seus fetiches - as tais coisinhas de mulher, esses apetrechos que tornam a mulher mais mulher - inteira e íntegra como ser humano feminino, sem deixar em momento algum de ser desejável (o que, por outra, também pertence à província da biologia).
Conheça melhor a Arte de Solange Palatnik
Imagens da apoteótica exposição FEMINICES e FACEIRICES, de Solange Palatnik, na Galeria Wall Street, de Jack Bell (segunda foto com a artista), no Shopping Cassino Atlântico, em Copacabana, Rio de Janeiro.
"SEM TEMPO SEM SONO - PINTURA URGENTE ... fome de pintura " by Solange Palatnik.
Paixão e Instinto!©Alexandros Papadopoulos Evremidis*
Esta é a quarta exposição que vejo de Solange. Ao observar atentamente suas presentes criações, a idéia que havia espontaneamente em mim nascido por ocasião da primeira e crescido nas duas subseqüentes, agora toma corpo e se afirma e se confirma e, mais, praticamente se cristaliza. De fato, a artista não quer nem saber e não está nem aí para marés e para correntes que, umas e outras, e de uma forma ou de outra, empurram ou arrastam o comum dos artistas, inseguros das suas convicções, para esta ou aquela direção, modismo, para onde sopram os efêmeros ventos e as súbitas ventanias.
Solange, não! Amadurecida em seus propósitos, ela se configura em autêntico protótipo de pintora e como tal faz o que a um pintor cabe fazer - simplesmente pinta e, dando ouvidos às vozes interiores, só obedece às enxurradas de suas próprias e avassaladoras emoções e sentimentos. Basta prestar atenção ao título da presente expô, um genuíno achado, ousado, por íntimo e confessional, mas sincero e sem falsos pudores, de público assumido, e tudo estará aclarado.
Outra coisa que me chama a atenção é que, ao menos durante esse quadriênio em questão, a técnica é a mesma e também mesmo é o tema, mas em compensação a qualidade de seu fazer artístico deu um violento salto e ganho quânticos. Sim, não há como negar - vi isso nas expressões estampadas no rosto dos presentes ao vernissage e ouvi isso dos lábios de todos quantos indaguei e auscultei, à guisa de pesquisa. As suas cores são mais coloridas, mais fortes e mais brilhantes e luminosas e suas formas de rosas, antúrios e mulheres, mais sensuais e mais vibrantes.
As criações de Solange cumprem plenamente o que a arte dita e exige de seus súditos - nos emocionam e comovem, excitam nosso senso estético e nossos sentidos, nossa libido inclusive e, talvez, sobretudo. É uma pintura, portanto, afirmativa e alegre, quem ousaria dizer o contrário? Está certo, aqui e ali, há rostos de mulheres sombreados de certa melancolia, de sisudez e compenetração, mas ... disse-me a vívida e encantadora assistente da artista, talvez seja essa mesma a intenção - a da insinuação de um mistério e a da constituição de um desafio a ser enfrentado e decifrado, o que realmente não carece de sentido.
Mas ainda assim há considerações a tecer no tocante à técnica personalizada e proprietária que Solange desenvolveu e elaborou empiricamente. Consiste isso na aplicação de generosas quantidades de matéria pictórica, resultando em impactante "inpasto", a ponto de suas pinturas adquirirem caráter escultórico, relevos vulcânicos e epicíclicos, uma topografia visual e dramaticamente acidentada e, daí, sedutora dos nossos olhares e das nossas imaginações.
Não esquecer também do componente lúdico, quase folclórico, que é o uso que Solange faz, além de pincéis, de variado e inusitado instrumental, tais como colher de pedreiro e de utensílios de cozinha. Mas o que a mim mais me fascina e encanta é essa abordagem absolutamente física e sensual e contemporânea que ela tem com a tela e a pintura em processo e progresso - ora deitada e debruçada sobre ela no chão, como se num enlace amoroso, e ora sobre a mesa, nas paredes e, também, por que não? no cavalete - o amado burrico preferencial dos artistas dos últimos séculos. Tudo gira nas pinturas de Solange, há uma dinâmica interna muito forte que ora nos atrai centripetamente pro buraco negro e ora nos atira pra centrífuga, pro abismo do ser e do nada. É uma vida no limite do fio da navalha, do instinto e da paixão, do Eros e do Tánatos.
Por fim, o penúltimo atributo das criações de Solange, já que último tão cedo não haverá, que me salta aos olhos e me invade o pensamento, é esse caráter de cândida inocência, de vigorosa juventude, de fluente energia e permanente tesão que permeia o conjunto de sua obra. Não a conhecesse fisicamente e não soubesse de sua maturidade, e pensaria tratar-se de uma jovem em plena floração, uma "cunhataí" autóctone, pronta e toda aberta para o amor - destino irrecorrível de todo ser vivente.
Na ausência da captura real, as suas pinturas me remetem àquelas adolescentes sensíveis e de rica vivência interior, que mantêm diários e obsessiva e passionalmente os povoam com desenhos apaixonados e apaixonantes de flores e de corações e os enfeitam com borrados de pilots, esfregaços de lápis de cor e de cera, adição de purpurinas, aplicação de paetês, de strass, de pozinhos das mais diversas colorações, decalques e fitas adesivas e auto-colantes de dizeres significativos, sinais apócrifos, marcas de beijos de batons incendiários de qualquer fantasia. Esse o poder dos verdadeiros artistas - movimentar nossas existências, preencher nossos vazios e conferir sentido aos desertos porque somos habitados.
©Alexandros Papadopoulos Evremidis = escritor crítico
"PINTURAS", de Solange Palatnik.
Paixão avassaladora.
©Alexandros Papadopoulos Evremidis*
Essa moça, Solange Palatnik, além de ser uma "très belle e très chic femme", é um caso à parte no panorama das artes domésticas. Isso por estar alheia à digladiação e ao chasma que, qual cisma religioso, irremediavelmente separa a contemporaneidade. Os conservadores confinam a arte, enferma e agonizante - dizem -, numa UTI e os progressistas exultam com o saudável experimentalismo democrático e lúdico.
Solange, que não pertence a nenhuma escola, embora a todas namore, por entre as duas correntes, cria sua própria vertente, inventa seu rio privativo e, solitária, qual Odysseus, nostalgicamente navega em busca de sua amada Ítaca. Um rio caudaloso e apaixonante, é claro. Como ardente e efervescente é a sua arte. Desde os tempos dos "feras selvagens" franceses e das "gritarias" dos rebeldes, por oprimidos, alemães, vê-se raramente quem se submeta à arriscada estética da exposição, ainda que com puro lirismo, amorosa entrega e reverente devoção. Seu nome é paixão. E avassaladora! - porque nos torna seus vassalos, súditos incontestes.
Seu universo pictórico aqui/agora escoa para o binômio - flores e mulheres, mas é como se de uma e a mesma coisa nos falasse; talvez, por serem construídas de igual estofo e idêntica essência; talvez por ambas aspirarem ao que, sublimando a crueldade da "physis", embeleza a vida e lhe confere sentido. De mais a mais, se pintura é cor, quem mais categorizado para dela nos dizer do que a flor? Não seria prosáico cantar que flores nada mais são que cores. Quanto às mulheres, por serem ou quererem ser flores, ao menos a elas se parecerem, não contentes com o que a natureza as dotou, desde sempre a recriam, pintando-se de cima abaixo - dos cabelos às unhas dos pés; e recentemente até as "pudenta".
Para nos revelar umas e outras, Palatnik recorre à tinta acrílica sobre telas de consideráveis dimensões, e por vezes, por premente exigência da criação em sua ânsia por expansão, até dípticos e trípticos, tudo bem proporcional ao tamanho da expressão de suas paixões.
Há uns dois anos, Palatnik nos agraciou com uma preciosidade, uma tela nomeada "Sophie", elegante e tecnicamente bem resolvida em seu propósito, porém, também triste, mirrada, perplexa, desencantada, olhar vazio olhando um mundo que, por instantes, ela não mais parecia entender, muito menos gostar; as mãos distorcidas, como a segurar as dores, sobre o ventre, que é onde as mulheres as sentem - no útero - e não no coração ou na mente, como dizem; e é também lá o centro de seu poder e de sua força, de sua fraqueza e de sua desolação - o chakra da vida e da morte.
Quanta distância para as suas atuais mulheres! É só olhar "Rosamundo" e "Natália", frente e verso do sagrado e do profano ticianesco. Uma, de olhos azúis e vestida de negro, um tomara-que-caia todo incrustado de rosas que mais parecem gigantescos rubis, encara o mundo com destemor e se doa com exuberância, com encanto, com sedutora vibração; uma diva, uma superstar galáctica; e ainda assim toda terra, úmida e cálida, sensual e receptiva. A outra ..., ahhh, a outra não está vestida, ela está toda nua, ou melhor, está vestida, sim, só que com fogo em chamas; uma nudez ardente, devastadora, incendiada incendiária, arrasadora! Vulcânica!
Rosamundo ainda tem suas insinuantes variações - sereias, agora de olhos verde-esmeralda, que nos dizem "sim", "talvez", "sempre" e perguntam "por quê?" Seria o eterno feminino - dissimular para seduzir? Que seja, nós já nos declaramos súditos. E há também o casal/magia, com duas cabeças, mas um só corpo, que tanto pode ser homem/mulher ou mulher/mulher, já que isso é o que menos vem ao caso, emergindo de dentro de um buquê de flores multicores, as borboletas polinizando a atmosfera impreganda de denso sensualismo. Sugerimos à artista que deixasse os amantes deitatos, insinuando que na horizontal melhor cumpririam sua função precípua, mas a urgência era tanta que não houve tempo hábil. Amam-se, portanto, em pé mesmo.
Calma, ainda nem falamos das flores - rosas para dar e vender, emprestar, alugar, presentear, dar, doar. Rosas de todas as cores, matizes, nuances, texturas - vermelhas, amarelas, azuis, verdes, cobre, ouro, ..., até negras! (Não foi Novalis quem se apaixonou por uma sonhada flor azul e Coleridge a encontrou no paraíso e com ela nas mãos acordou?!) Tendo todas sido contempladas, não poderá haver queixas. Quanto ao formato, as rosas de Palatnik assumem ora o de epiciclos, ora o de círculos excêntricos, se avolumando e expandindo como novelos e, por vezes, até explodindo, como se granadas, seus fragmentos se transfigurando em mais rosas ígneas, rosas atômicas. Algumas são escancaradamente abertas, outras apenas desabrochando e mais outras fechadinhas, botôes que parecem piões a rodopiar em dinâmico movimento, um pandemônio eletrizante. Sugestivas são as elípticas, que, na vertical, emulam o ginecéu - centro essencial da fertilidade e do prazer. Todas, porém, em suas composição, e numa perspectiva aérea, nos lembram alas de baianas em progressão, cadência e ritmo. Tudo nativo e ctônico.
Se pintora não fosse, Palatnik teria que, fatalmente, ser poeta**. Tanto que, aqui e ali, recorrendo à integração das linguagens, inseriu serpenteantes colares de pérolas literárias, tais como:
Meu Vôo:
"Quando tudo que existe não basta / fico pequena / viro flor / inicio meu vôo de poeta."
Meu pintar:
"Quando pinto / vejo flores / barcos que navegam / no universo "A água" ... / Quando penso na vida / me sinto poeta / O chão que piso é macio / como nuvens .../ O caminho que me espera, / é de encanto e beleza / muito colorido / o prazer do sol nascendo / o prazer de luas / em noites calmas."
Meu canto:
"Canto / para nosso encanto / no meu pranto / choro / lágrimas de desencanto / que também / encantam."
Para concluir, algumas palavras sobre uma propriedade autoral da técnica de sua criação. Como se suas rosas não pudessem, não devessem, nascer da tela nua, ainda que preparada e pintada, Palatnik carrega em espessas e sucessivas camadas de tinta, umas sobre as outras, criando várias imagens superpostas e assim originando quase um palimpsesto temporalmente simultâneo; no mínimo, um autêntico "impasto", o que lhe confere volume e textura ímpares, mais, um alto relevo pleno de acidentes e incidentes topográficos. Ou por outra: é como se ela se sentisse na obrigação de preparar o terreno, uma espécie de "Blumenbeet", uma estufa ou um canteiro com um extrato de terra fértil, rico em nutrientes e demais ingredientes necessários para que suas múltiplas sementes, após o devido período de dormição, pudessem brotar, desabrochar e ocupar o mundo - com suas cores, seus perfumes e as paixões que despertam. E nesse sentido podemos dizer que Palatnik, mais que pinta, esculpe.
Dizer mais seria profanar o sagrado fazer da artista. Áxia estí!** De fato, Solange Palatnik, além de gravadora e pintora, é também poeta e já publicou dois livros e lançou o cd "Amor Mulher". Aqui mais um exemplo:
rosamundo rosamundo e outras rosas / vindo, presença, vida / todas lindas / muito alegres / rodopiando faceiras / amarelas, azuis, vermelhas... / somos muitas rosas / cantamos, dançamos, enfeitamos / jardins infinitamente... / céu, dias e noites / questionamos, somos mulheres / pintando rosamundo me pinto /
Rio de Janeiro – 2002
©Alexandros Papadopoulos Evremidis > escritor crítico > amante (amado - assim espero:-) da Arte.
não...
não...
hoje não
não quero pensar não
não quero fazer nada não
amanhã ,depois de amanhã
hoje não
não quero sentir não
nem amor não
nem solidão não
hoje não
não quero saber não
não quero ser infeliz não
não quero pensar não
não quero não
hoje não
não quero nada não
não quero ouvir não
não me fale não
hoje não
não quero dançar não
não quero invasão não
não quero tormento não
não não e não
hoje não
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