"Miragem", de Janice Melhem Santos.
A cor como produto sujetivo

Janice expõe 18 pinturas em técnica mista: sete em pigmento e acrílico s/ tela; cinco em pigmento, acrílico e colagem sobre tela; e seis em óleo e colagem sobre cartão.

Nascida em Jequié na Bahia, Janice foi criada no Rio de Janeiro e há 18 anos, radicou-se em Paris. Para ela, a pintura é uma necessidade de registrar processos, momentos pessoais e sócio-culturais, que ficarão marcados na história com o passar do tempo. Esta exposição foi intitulada “miragem” em alusão ao fenômeno ótico produzido pela refração da luz, uma questão de grande importância na pintura: “O que cada um vê é derivado de sua projeção num espaço pictórico”- explica ela.

Com pequenas diferenças técnicas, as obras possuem um procedimento básico: superposição de camadas de cores, traços, colagens e incisões na tela ou no papel. Cada camada deixa transparecer resíduos da camada anterior, onde se alternam o gesto intencional e o acaso. O que está por baixo ou por cima se diferencia pela temporalidade, “o importante é que as coisas se superpõem, esta é a técnica e o conceito” – ressalta.

Janice tem uma preocupação especial com as cores, pois se propõe a usá-las como matéria estrutural do quadro, lançando mão constantemente do vermelho e do branco. Ela utiliza o pigmento saturado e também atenuado por sucessivas camadas de branco. “Uma massa de cor provoca tensões, gera equilíbrio, desequilíbrio e abre um espaço pictural. Algumas cores persistem, outras vêm e vão e posso chegar a combinações e tons raros em partes mínimas do quadro. Às vezes, só eu as vejo, mas elas estão lá, fazem parte da estrutura, num equilíbrio sutil. ”– conta ela.

A artista não trabalha com uma inspiração específica. Sua pintura é derivada de uma visão particular do mundo, partindo do que lhe intriga no momento, como um pretexto para pintar. Seus trabalhos não costumam receber nomes, a fim de deixar livre a interpretação de cada tela pelo espectador, que fica à vontade para perceber a obra e criar o seu próprio título. Eventualmente, Janice batiza um trabalho para focalizar um determinado aspecto ou como forma de pura diversão.

As pinturas que serão expostas em "miragem” na Galeria de Arte do CCCM são uma continuidade da mostra “Je tisse l'invisible”, realizada na Galeria Boulakia, em Paris, no ano passado. Embora haja diferenças, o aspecto constitutivo das obras são os mesmos: malhas, linhas verticais, incisões na tela. “Existe o grupo das linhas verticais paralelas, essas são mais racionais e vêm acalmar o jogo dos impulsos, já que paralelas nunca se encontram e tendem ao infinito. O outro grupo, o dos sulcos verticais que se encontram e se desencontram, se atropelam e se cruzam, ressalta a importância das superposições neste momento” – explica ela.

Formada em História, Arquitetura e Artes Plásticas, Janice já expôs em diversas mostras coletivas e individuais no Brasil (RJ e BA) e no exterior (França, Itália, Alemanha e Suíça).

Rio de Janeiro 2004


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