| Icléa Goldberg | ver é sair de si |

Obra_de_Icléa


Sim, elevados padrões de sensibilidade e conhecimento e/ou The line of beauty

©Alexandros Papadopoulos Evremidis*

Ver é sair de si, diz Icléa, com sublime poética e acuidade filosófica, e eu me pergunto se ela estaria se referindo ao "exo-stasis", de não caber em si diante do tanto encantamento de ser e de conhecer e para tal precisar de todo o espaço circundante, ou simplesmente ao "para ver, ter que ir de encontro ao Outro e envolvê-lo e acolhê-lo e desfolhá-lo e, fagocitando, assimilá-lo". Questão, por tautológica, irrelevante, e daí prejudicada.

Obras_de_Icléa

Críticos? Bem, críticos todos nós somos - a cada manhã e a vida toda. Não bastasse, ainda fazemos o Outro de crítico e também o espelho - as melhores mulheres não passam sem. Mas isso ocorreu há um sem-tempo - por ocasião de algum eugênico over-crossing filamentoso ou daquela ur-sinapse que em seu acaso e em sua necessidade, em sua dramática tentativa e erro (minhoca pondo a cabeça pra fora da terra e "tateando e fungando" as umectantes direções pra saber que direção tomar ou será mais sensato re-cuar? (não será aceita a piada do lado em que ele fica, tendendo a confundi-la com os fundilhos), acertou e nos apartou e distanciou do (nobre) animal e nos trouxe até aqui, construindo a civilização que ufanisticamente chamamos de nossa e que é, portanto, função da crítica.

Parcial da superior
Detalhe_da_obra_de_Icléa

Isso tudo para dizer que o crítico aí aqui está para criticar e, o pior e o melhor sendo pontos-de-vista e masturbadora mera semântica, no mais das vezes há o que criticar - por falta e/ou por excesso, resultando em abscesso.

Tudo isso é pra dizer do imenso e inenarravél prazer e da exultante alegria de chegar a uma exposição e, não encontrando as palavras direitas da perfeição, ter que apelar e recorrer às extemporâneas esquerdas e tortas, aos palavrões (palavras "grandes", prenhes e carregadas de emoção): uma fração a mais ou a menos e tudo isso teria resultado em uma grande merda (como tanta há por aí), disse eu então heroicamente ruborizado à Icléa, me referindo à sua hipérbole (nutriz e geratriz, já que natural úbere e ventre embuchado sinalizava), suspensa no hall; à sua ofídica curva (the beauty of line, que o graaande Hogarth, iniciador da gloriosa, por pioneira da modernidade, pintura inglesa, com Constable, destacando, e Turner, borrando, orgulhosamente ostentava sobre a sua paleta) em revoada passarinheira que se resolve em reta (que vem a ser curva de raio infinito, no dizer do genial matemático e gaiato filósofo Leibnitz) na parede da galeria contígua; ao seu mega-estilingue (agora, desfuncionalizado, visto não apontar para a insinuada insinuante passarinhada) com duas hipérboles conjugadas - (imaginei) uma projetando sementes para o interior da fenda da outra - ulalá!; à sua cerca ou feixe (o fascio do fascismo) desconstruída; e mais à sua plantação/cemitério (ou o quer que seja, que fosse - je m'en fous) de cubos brancos/alvos de que brotam curvas de fios de cobre - uma pesquisa de arcaicos arcos. Mas com que inocência e delicadeza.

Obra_de_Icléa

Tudo medido e pesado, tudo com tanta refinada elegância e etérea leveza, que, se eu não parar agora farei eu mesmo merda, profanarei as criações dessa diáfana moça que, embora táctil, é absoluta e surpreendentemente incorpórea. Cum laude, por tanto, e com acento circum e genuflexo.

Fotos: W. Montenegro

Rio de Janeiro 2005

Alexandros Papadopoulos Evremidis = > escritor crítico > Email


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