| Hugo Ferreira | Sementes da terra - esculturas |

Sementes_da_terra Arte, história e religiosidade nunca estiveram tão próximos, como nesta exposição, na Galeria de Artes Pretos Novos, na Gamboa. O local é reconhecido como sítio arqueológico pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, desde 1996, quando o casal Merced e Petruccio, encontraram, durante obras de reforma da casa da família, fragmentos de crânios, muitos pedaços de objetos e uma grande quantidade de ossos humanos. Pesquisadores arqueológicos descobriram que o local tinha sido o Cemitério dos Pretos Novos, no século XIX, lugar destinado na Gamboa aos enterramentos de escravos africanos recém-chegados, que morriam logo após o desembarque.

Em harmonia com local tão repleto de referências históricas, a exposição Sementes da Terra, enfatiza o caráter afetivo-religioso do artista plástico baiano Hugo Ferreira, também conhecido como Hugo d’ Ajussum nos meios afro-religiosos, ao evocar a continuidade do povo negro, através da sua ancestralidade.

Através de doze esculturas de diversos tamanhos, Hugo Ferreira recria costumes funerários de antigos povos africanos do Benin que “plantavam” os orgãos internos dos parentes falecidos em potes de barro criativamente ornamentados, para que servissem de sementes do novo ser que viria. E na tampa do pote era esculpida a cabeça do santo ou do vodum (alma) da pessoa retratada em imagens vivas e fortes.

Na exposição Sementes da Terra, seguindo uma construção lógica, não rigorosa, Hugo Ferreira aborda questões bidimensionais e tridimensionais, através da pesquisa sobre a essência do ser. Sua preocupação vai além da forma, buscando a sensibilidade da construção, que assume novo corpo, novo espaço, novo pensamento, à medida que outras informações lhe são somadas, relacionando-se, direta ou indiretamente, com o mundo percebido.

Essa forma de ver o mundo e representá-lo é, na opinião de Hugo Ferreira, essencialmente Jeje – uma nação de ancestrais em contínua transformação, cujos corpos lançados na terra tal qual semente renascem em novos corpos, desmentindo a morte desta forma. Por essa linha de pensamento nós somos nossos avós e todos que nos antecederam em nossas famílias e nossos filhos nos perpetuarão, pois estaremos em todos que virão depois como parte da nossa energia, da nossa dualidade e capacidade de metamorfose.

“A África espalhando seus filhos por toda a terra, levando seu conhecimento, sua religião e sua cultura, não seria tudo isto um propósito dos Voduns? Não seriam seus filhos sementes a germinarem em outras terras levando sua religiosidade, cultura e saber?” Diz Hugo Ferreira, no que é aprovado por Merced e Petruccio, bons guardiões da cultura negra, sempre de braços abertos para receber a arte e os artistas afro-brasileiros em seu portal arqueológico na Gamboa.


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