"PINTURAS", de Esther Martins Moreira
Entrevista-relâmpago
©Alexandros Papadopoulos Evremidis*

Aqui vai o universo intelectual da sensível e corajosa artista que, diga-se de passagem, recebeu rasgados elogios da imprensa britânica, que viu em seus trabalhos o retrato do sul-americano mundo mágico, perverso e cruel, de Gabriel Garcia Marques, claro, guardadas as devidas proporções e os meios de expressão. A equipe do Jornal Rio Arte Cultura assina embaixo e se declara impactada pela lucidez e força psicanalítica e redentora da obra e da palavra de Esther que, por momentos, chega a ser premonitória. A arte de Esther é poesia-verdade!:

Jornal Rio Arte Cultura: O óleo brasileiro - o da floresta devastada - tem caráter ambiental ou parabólico da condição feminina? E, em qualquer das hipóteses, os rostinhos flutuantes por entre os tocos das árvores serradas representam as dríades ou almas de mulheres terrenas?
Esther: O óleo brasileiro não almejava diretamente falar sobre a condição feminina, não era esta a minha intenção ao fazer o quadro. Tinha muito mais em vista a situação da floresta brasileira e do que de terrível estão fazendo com ela. No entanto, pode-se ver o quadro como se quiser e é sempre possível se fazer uma analogia com nossa floresta interior, com o primitivo dentro de nós e em português, floresta é feminino o que já não ocorre em alemão (der Regenwald). As cabeças flutuantes são recorrentes nos meus últimos quadros e, para mim, representam almas ou "unlived sides of ourselves".

Jornal Rio Arte Cultura: O tema recorrente do feminino revelando em fraturas expostas o tenebroso e o oculto, é uma vivissecção e tem efeito catártico sobre a tua psique? Se afirmativo, poderia ser extensivo a todas as mulheres?
Esther: Eu acho que pode ser visto como uma vivissecção o que eu tento fazer nas pinturas. É certamente uma tentativa de investigação do que não está aparente em nós mesmos e concordo que possa ter um efeito catártico em relação ao autor, no caso, eu mesma. Mas não só um efeito catártico e sim também transformador, como no antigo teatro grego. Daí a ter o mesmo efeito em outras pessoas, já não posso afirmar. Penso que já ficaria satisfeita se meu trabalho levasse o espectador a refletir um pouco sobre nossa condição.

Jornal Rio Arte Cultura: A mulher européia é mais consciente e libertária do que a brasileira? E, se afirmativo, a que você atribui isso?
Esther: Não creio que ela seja mais consciente, mas ela não passa, via de regra, pelas agruras materiais que a maioria de nossas mulheres passa e isto é algo inestimável. Mais consciente politicamente, socialmente, talvez, mas self-knowledge é muito difícil, em qualquer lugar do mundo.

Jornal Rio Arte Cultura: E de um modo geral a mulher pós-feminista é real ou nominalmente livre?
Esther: Não creio que ela seja realmente livre porque acho que poucos de nós são realmente livres. Não se pode ser livre sem se ter consciência de quem se é e dói muito ter essa consciência, acho que por isso vivemos como no filme "Matrix", mortos a maior parte do tempo.

Jornal Rio Arte Cultura: E em vista do Congresso de Durban - você acha que o racismo é fenômeno natural ou cultural? O Brasil deve ou não pagar indenização aos países africanos fornecedores forçados de escravos?
Esther: Um fenômeno cultural. Não me sinto em condições de opinar sobre este assunto.

Jornal Rio Arte Cultura: O que mais te angustia no mundo de hoje?
Esther: O fato de que vejo o mundo funcionar na maior parte do tempo numa espécie de piloto automático. Isto é a morte.

Rio de Janeiro 2001.

©Alexandros Papadopoulos Evremidis > escritor crítico > Email


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